Segundo dados do Censo Escolar, divulgado pelo Inep, o número de alunos com transtorno do espectro autista (TEA) que estão matriculados em classes comuns no Brasil aumentou 37,27% em um ano. Em 2017, 77.102 crianças e adolescentes com autismo estudavam na mesma sala que pessoas sem deficiência. Esse índice subiu para 105.842 alunos em 2018. Foi nesse cenário, em junho, que a pedagoga Vânia Andreia Silva Coutinho, com a ajuda de profissionais de Educação Física, psicólogo e neuropedagogo, decidiu criar uma iniciativa que mudaria a vida de dezenas de famílias através dos exercícios físicos. Assim nasceu o projeto “Futuro”, que funciona na academia Body Place, na Ilha do Governador, com a ideia de promover autonomia aos alunos que dele participam.
“Montei um grupo de pessoas voluntárias na Marinha e como eu sou pedagoga, achei que também era uma boa oportunidade de exercer a minha profissão. Passei a ir para eventos para conhecer mais sobre esse universo (do autismo). Planejamos onde poderíamos dar palestras”. O projeto é promovido gratuitamente as terças e para os alunos pagantes, as quartas e sextas-feiras. Ao todo são nove alunos (3 crianças menores e 6 adolescentes). Todos eles são indicados pelas suas respectivas escolas.
Se o aluno fizer todas as tarefas solicitadas, ele ganha algo que ele goste mais. Depois que eles passam a confiar nos professores, a relação melhora e o desenvolvimento deles flui.
Vânia Andreia Silva Coutinho, idealizadora do projeto Futuro
Durante as atividades, os beneficiados são estimulados a interagirem com os professores e com os outros alunos da academia com a finalidade de, através dos exercícios executados nas aulas, alcançar uma melhora no estado físico, mental, verbal e comportamental das crianças.
Antes de participarem do projeto, os pais dessas crianças são entrevistados pela equipe responsável para obter um maior entendimento sobre o histórico e cultura familiar. O primeiro passo é criar um elo de confiança com essas crianças, adentrando nos rituais particulares antes mesmo de estabelecer qualquer regra. “O Danilo (aponta para a criança) tinha pavor de ventilador, mas durante o projeto ele começou a enfrentar esse medo e hoje já consegue ligar o ventilador quando sente muito calor”, conta Vânia.
A idealizadora do projeto acrescentou ainda: “pensamos em estratégias para atrair e conquistar cada um deles. Conhecer os gostos é essencial, pois nós usamos essas preferências para negociar com eles. Se o aluno fizer todas as tarefas solicitadas, ele ganha algo que ele goste mais. Depois que eles passam a confiar nos professores, a relação melhora e o desenvolvimento deles flui”.
Em reuniões realizadas quinzenalmente, os efeitos das atividades físicas na vida desses alunos são debatidos. Nessas reuniões, também são definidos os dias em que cada um terá contato com eles. “Se apenas um professor trabalhar com determinada criança, ela vai se apegar ao professor e o dia que este não estiver no projeto, outro professor não vai conseguir dar aulas sem ter a confiança deles”, explica. São feitas atividades individuais e momentos de atividades em grupo. O desafio é colocar as patologias próximas, trabalhando juntas, promover a interação entre os alunos para minimizar os efeitos do transtorno.
Um dos objetivos do exercício físico, em combinação à outras dinâmicas, é gerar autonomia aos alunos para que tenham condições de viver de forma independente, caso o pai ou mãe de algum deles morram. “No grupo de adolescentes e jovens autistas, tinha um de 34 anos procurando um abrigo porque não tinha com quem morar, pois os pais dele morreram e os parentes não quiseram ajudá-lo. Essa é a preocupação de algumas mães. Criar um pouco de independência para que isso não aconteça com eles”. Segundo uma das idealizadoras, o autista que já evoluiu pode continuar indo à academia de forma inclusiva, obtendo orientações de treinamento junto aos demais alunos do estabelecimento.